27 de abril de 2009
Retalhos de Silêncio...
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25 de abril de 2009
24 de abril de 2009
23 de abril de 2009
21 de abril de 2009
20 de abril de 2009
Jiribungo Escarlate
- Boa tarde, para onde?
- Boa tarde. – Retirei as soltas moedas do bolso e coloquei-as ordenadamente no balcão - Até onde posso ir com - enquanto contava as moedas - 74 Eras e 16 Dias?
- Bem deixe-me ver – pegou num colorido mapa ferroviário e explicou de forma miúda – tem duas hipóteses com essa quantia. Bayonne Beach ou Carnasse Café.
Parei para pensar. Por um lado, Bayonne Beach era um sítio calmo, cheio de luz e endireitadas ruas. O sítio preferido de gordas famílias e estrangeiros limpos, para observar as bizarrias culinárias da Mãe Natureza. Era de facto um local idílico para se relaxar entre fartas árvores, cujos ramos pingavam frutas doces e flores cheirosas.
Por outro lado, Carnasse Café era um cabaret subterrâneo de ténue luz, cheio de velhas mesas e cadeiras envolvidas em fumo. O sitio habitual de vultos curiosos e movimentos sub-reptícios, cujos copos estavam sempre sujos e a musica acordada até altas horas da noite.
- Queria um para Carnasse Café! – Apetecia-me acção e não contemplação.
- Aqui tem. – Escorregou um minúsculo ticket insonso, daquela mãozinha de unhas pintadas. – Faça uma boa viagem.
- Obrigada.
Sob os calcanhares emborrachados, dei meia volta e fui-me sentar num dos bancos perdidos do longo corredor. Pouco tempo depois, um homem atarracado, vestido de azul morto e olhar bovino, gritou “Carnasse Café a sair dentro de 5 contratempos!”. Agarrei na intrépida mala, entrei no ferrugento comboio e coloquei as rodelas de esponja nos ouvidos. Tocavam uma sequência de músicas escolhidas criteriosamente.
A viagem iniciou-se com solavancos esguios e sedutores e sob a almofada daquele acto sexual, entre os carris e as pesadas rodas metálicas, deixei-me adormecer. Não me lembro do que sonhei, mas sei que tinha qualquer coisa a ver, com baldes de pássaros atirados para um rio de vento.
Acordei com os apitos esganiçados do comboio. Meio estremunhada, recompus-me daquele sono rápido e fui espargida pelos gafanhotos do revisor farfalhudo, que esbracejava que nem um ganso, para que todos os passageiros saíssem do bendito comboio.
A gare de Carnasse Café encheu-se de gente salpicada por meios-tons e a luz do inicio de noite, fazia ricochete entre os enormes vitrais deslavados. A fome apertou o botão das minhas calças e em frente a um quiosque amarelado parei para comer. Enquanto bebia um sumo e trincava um pão esfarelado, observei uma mulher já de idade madura dormir refastelada, por cima de uns livros abandonados. A sua respiração embriagada fazia lembrar a de uma criança, depois de uma mamada maternal e a sua expressão enrugada, esbatia-se nas páginas velhas dos esburacados livros.
Estava de pé, de frente para a única rua em Carnasse, polvilhada de lâmpadas pendentes em janelas desalinhadas e a minha respiração confundia-se com os vapores dos rotos esgotos. O concelho de Carnasse era constituído por um único e denso edifício, populado por casas de albergue, motéis de terceira classe e pensões escorregadias. Todo aquele concelho vivia à custa do Cabaret e os seus habitantes eram gentes cinzentas, manchadas de nódoas monocromáticas com almas de madeira esfarrapada.
Ah como era bom estar ali, no meio daquela miséria lodosa mas recheada de tesouros resplandecentes, de pessoas não comuns e atrevidas, de ratos que se confundem com cães de pequeno porte, de trocas carnais e comerciais duvidosas. Carnasse era realmente pitoresca, havia uma azáfama inebriante nela que me fazia lá voltar inúmeras vezes, à procura das sensações mais entranhadas e viscerais que me fora habituando.
Ao chegar ao final da única rua de Carnasse, desci umas escadas peganhentas e ao entrar no cabaret, imediatamente as minhas narinas se cruzaram com o fedor de tabaco antigo, suor azedo e bebida entornada. Recordei o vermelho familiar que amaciava as paredes duras, continuava tudo tal e qual como tivera deixado da última vez, apenas as personagens ocupantes do escuro cenário, diferiam desta lembrança.
Sentei-me ao bar na companhia da minha mala, despi o inquebrável agasalho e atirei-o para cima da cadeira vaga a meu lado.
- Boa noite. O que vai desejar hoje? – Perguntou o distinto empregado do bar a coçar as ramelas.
- Qual é a bebida da noite?
- Ah…hoje penso que é a de Jiribungo! – Apontou para um quadro de ardósia, com um sorriso entre as cáries negras.
- Não conheço. O que é isso Jiribungo Escarlate?
- É um fruto bastante doce, sumarento e cheio de sementes. Bem coado dá um sumo melhor que o álcool, porque não tem os efeitos secundários deste.
- Oh Seixas, lá estás tu a tentar a enganar o pessoal – disse mais desinibida – isso deve ser mas é uma fruta que apodreceu para ai e agora vocês vendem como sumo.
- Estou a falar a sério. Mas fazemos o seguinte, ofereço o primeiro copo se não gostares não pagas, ok?
- Venha ele então!
Seixas despejou maquinalmente para um sujo copo o tal sumo e resolvi verificar olhando em volta, se mais alguém estava a beber Jiribungo. Não queria ser a única a cair na esparrela do Seixas. Ao contrário do que seria de esperar, quase todos os vultos daquele cabaret estavam a beber Jiribungo em copos largos. Beberiquei a medo o meu copo, um sabor bastante doce e quadrado espalhou-se pelas minhas papilas gustativas. Tinha um travo a terra no final, mas era agradável.
A três cadeiras de mim, estava um jovem casal em poses deveras provocatórias. A rapariga lambia luxuriosamente o cinzeiro, como se o dito objecto tivesse sido mergulhado em cinzas de mel, e o companheiro esperava que ela acabasse com as ávidas lambidelas, para a beijar apaixonadamente. Fitei-os durante um bocado até Seixas ressurgir, por detrás do comprido e transparente espelho que se encaixava comodamente, nas prateleiras das bebidas.
- Então é bom ou não? – Silvou Seixas com as duas mãos apoiadas no bar.
- É bastante agradável. Venho cá amanhã para beber outro, fico por aqui uns dias.
- Atenção – com um ar meio fanfarrão – porque o efeito alucinogénio de Jeribungo, só começa após umas horas do seu consumo.
- E só agora é que avisas... Olha lá, já agora explica-me uma coisa, porquê é que lhe chamam de Escarlate? Se o conteúdo do copo que aqui tenho é espessamente verde?
- Não queremos nada que não esteja de acordo com as paredes e cortinas desta casa, pois não?
- Pois não…
15 de abril de 2009
6 de abril de 2009
Falta de inspiração
Escreve, escreve, escreve,
Respira, respira e transpira,
Pensa, pensa, pensa.
Puxa, arrasta, desfaz,
Arranha a alma que sangra,
Estampada numa página muda.
Cospe um pouco de letras,
Amarfanhadas e toscas atropelam-se,
Em delírios contorcidos e vozes fugazes.
Letras que saltam, que fogem, que gritam desconfortáveis,
Nada cresce, nada vence, nada escuta.
Não consegues…
Desiste, refaz, rescreve,
Puxa pelos cabelos da cabeça vazia,
E um olhar obnubilado alcança a tua mão.
A velocidade interpela a criatividade.
Mete para dentro de uma rede imaginária,
Aquilo que não consegues meter para fora.
Falta regar uma vida em crescimento,
Que se esmiúça por palavras sentidas,
Metidas num buraco, onde toupeiras esgravatam,
E alcançam a solidão tranquilizante pela…
Falta de inspiração!
4 de abril de 2009
Carne de Metal
Desaparafusa sentimentos,
É favor de reiniciar máquina.
Floresta florescente
Cheiro o perfume da tua tempestade.
Morreste entre pétalas caídas no corpo da terra,
E a inocência perdeste em submissa seiva.
Caules cortados por espirais de ventos ritmados,
Dançam e cantam agora em uníssono.
Deita-te a meu lado e ouve a cor das flores,
Cujas palavras picam no chão da chuva.
Raízes de prazer seguram o tormento de desertas planícies,
E a loucura de um sol desorientado espreita.
Entre nuvens incandescentes, borboletas viciadas desaparecem.
Imagens de azul-pálido beijam a brisa, que paira numa recordação.
Não sou uma santa em teu armário de sorrisos,
Nem estátua alimentada por um sentimento verde.